Uma visão geral sobre o que são palavras racistas

Palavras racistas são termos que carregam significados ofensivos e depreciativos em relação a um grupo racial ou étnico, em particular à população negra, e estão profundamente enraizadas na língua e na cultura de sociedades com histórico de escravidão, como a brasileira. Essas palavras não são apenas expressões isoladas, mas fazem parte de um sistema de racismo linguístico que reflete relações de poder desiguais e preconceituosas.

Ao longo dos séculos, essas expressões foram incorporadas ao vocabulário cotidiano, muitas vezes sendo reproduzidas de forma inconsciente, perpetuando uma visão de mundo colonialista. Um exemplo disso é a expressão “denegrir”, que significa manchar a reputação de alguém e carrega a ideia implícita de que algo escurecido é negativo.

Por isso, é essencial entender que o uso de termos racistas, mesmo de maneira não intencional, dá continuidade à exclusão e ao preconceito. Quando reproduzidos, eles reforçam uma hierarquia de poder baseada na cor da pele e na inferiorização de pessoas negras. Cabe a todos nós questionar, desconstruir e abandonar esses termos em favor de uma linguagem que valorize a diversidade e o respeito.

História dos termos racistas no Brasil

O racismo no Brasil tem raízes profundas e foi institucionalizado ao longo de mais de três séculos de escravidão. Vale lembrar que fomos um dos últimos países do mundo a abolir a escravidão (apenas Mauritânia, Arábia Saudita, Zanzibar e Etiópia o fizeram depois de nós), e que as consequências desse atraso podem ser sentidas até hoje.  

O vocabulário popular, influenciado pela cultura colonial e escravagista, desenvolveu termos que refletiam a tentativa de justificar a subordinação e a marginalização dos negros. Expressões que hoje reconhecemos como racistas surgiram nessa época para reforçar a ideia de inferioridade das pessoas negras.

Por exemplo, o termo “mulato”, originado de “mula”, refere-se a filhos de brancos e negros, desumanizando indivíduos ao compará-los a animais. Ainda que pareçam inofensivas para alguns, essas expressões em português perpetuam o racismo estrutural ao associar características físicas de pessoas negras com conceitos negativos.

Como o racismo linguístico perpetua desigualdades

O racismo linguístico é o uso de termos e expressões que reforçam estereótipos e desigualdades raciais, refletindo e perpetuando preconceitos em diferentes esferas sociais. As palavras que usamos no cotidiano são poderosas, pois moldam nossa percepção de mundo e, ao mesmo tempo, reforçam normas sociais.  

O uso de expressões como “serviço de preto” ou “lista negra” são exemplos de como a língua carrega preconceitos históricos que associam a negritude a algo negativo. Trata-se de palavras que reforçam a associação entre pessoas negras e aspectos degradantes ou inferiores. Isso, é claro, impacta como as pessoas pretas são percebidas na sociedade.

Além disso, o racismo linguístico afeta diretamente relações interpessoais. Ao naturalizar termos racistas, reforçamos a hierarquia racial implícita no discurso, normalizando a discriminação e excluindo a população negra de espaços de poder.

A linguagem, portanto, não é neutra; ela reflete as desigualdades presentes em nossa sociedade e, ao mesmo tempo, ajuda a mantê-las. Combater expressões racistas é um passo fundamental na luta pela equidade racial, já que a desconstrução do racismo passa também pela forma como nos comunicamos e representamos o outro. 

Contexto do Dia Nacional da Consciência Negra

O Dia Nacional da Consciência Negra é celebrado no Brasil em 20 de novembro. Instituída em 2003 e incluída no calendário escolar nacional, a data se tornou oficialmente reconhecida como feriado em diversas cidades e estados do país. O 20 de novembro foi escolhido por marcar a morte de Zumbi dos Palmares, em 1695, líder do Quilombo dos Palmares e um dos maiores símbolos de resistência negra contra a escravidão no Brasil.

Zumbi é uma figura central na história da resistência negra, pois o Quilombo dos Palmares representava um refúgio para negros que fugiam do regime escravagista. Localizado no atual estado de Alagoas, o local abrigava milhares de pessoas, incluindo negros, indígenas e até brancos, formando uma comunidade baseada na liberdade e na luta contra a opressão. 

O Dia da Consciência Negra é uma data de reflexão sobre o racismo estrutural presente na sociedade brasileira. Apesar da abolição da escravidão em 1888, a desigualdade racial e a discriminação continuam a afetar a população negra de maneira profunda. 

A data busca não apenas celebrar a cultura e a resistência afro-brasileira, mas também conscientizar a sociedade sobre a necessidade de combater o racismo em suas várias formas, incluindo o racismo linguístico e o preconceito presente nas estruturas políticas, sociais e econômicas do país.

Palavras e expressões racistas

Expressões carregadas de significados históricos que remetem à inferiorização da população negra ainda são amplamente utilizadas. A seguir, apresentamos uma lista de termos racistas, suas origens, o porquê de serem ofensivos e como podem ser substituídos por expressões respeitosas no dia a dia.

Mulata

  • Motivo: vem de “mula”, implicando uma mistura racial indesejada, desumanizando pessoas mestiças como se fossem “produtos” dessa mistura.

  • Alternativa: mulher negra, mestiça.

Escravo

  • Motivo: reduz as pessoas submetidas à escravidão a uma condição de objeto, desumanizando-as; o ideal é usar "pessoa escravizada," focando na humanidade.

  • Alternativa: pessoa escravizada.

Samba do crioulo doido

  • Motivo: termo que associa pessoas negras à confusão e irracionalidade, além de usar “crioulo” como termo depreciativo para negros.

  • Alternativa: bagunça geral, confusão.

Cor de pele

  • Motivo: indica tons claros como padrão de pele ou de “carne”, desconsiderando a diversidade racial e reforçando uma visão eurocêntrica.

  • Alternativa: bege, nude, claro.

Judiação

  • Motivo: ligado ao sofrimento histórico da comunidade judaica, o termo banaliza a dor dessa população, ainda que tenha se tornado expressão corriqueira.

  • Alternativa: pena, sofrimento.

Negro de alma branca

  • Motivo: pressupõe que características “boas” são exclusivamente de pessoas brancas, reforçando um estereótipo racista de inferioridade.

  • Alternativa: pessoa íntegra, de bom caráter.

Meia-tigela

  • Motivo: originou-se do costume de dar menos comida para pessoas escravizadas, remetendo a uma discriminação e subjugação da época.

  • Alternativa: incompleto, insuficiente.

Da cor do pecado

  • Motivo: fetichiza pessoas negras, tornando sua aparência um objeto de desejo exótico, desumanizando sua identidade.

  • Alternativa: pele radiante, pele bonita.

Morena

  • Motivo: muitas vezes usado para evitar o termo “negra”, minimizando a negritude e desconsiderando o orgulho racial e a identidade negra.

  • Alternativa: negra, pessoa de pele escura.

Serviçal

  • Motivo: frequentemente associado ao período escravocrata, carregando conotação de servidão, diminui o valor das pessoas em atividades de serviço.

  • Alternativa: colaborador, ajudante.

Negra maluca

  • Motivo: frase que utiliza "negra" para simbolizar descontrole, reforçando a visão de que mulheres negras são irracionais ou instáveis.

  • Alternativa: pessoa fora de controle, sem limites.

Denegrir

  • Motivo: expressões como “denegrir” significam tornar algo ruim ao compará-lo com a cor negra, associando negritude a aspectos negativos.

  • Alternativa: substitua “denegrir” por “prejudicar” ou “manchar a imagem”.

Capacho

  • Motivo: originário do tempo da escravidão, refere-se ao trabalho de pessoas subjugadas e associadas a submissão extrema.

  • Alternativa: tapete de entrada, pessoa submissa.

Lista negra

  • Motivo: o termo associa o “negro” ao negativo e proibido, reforçando estereótipos pejorativos contra pessoas negras.

  • Alternativa: lista proibida, lista de bloqueio.

Mercado negro

  • Motivo: termo que utiliza “negro” para designar o ilegal, subentendendo que o “negro” é algo moralmente incorreto.

  • Alternativa: mercado ilegal.

Preto de alma branca

  • Motivo: sugere que apenas características positivas pertencem ao branco, reafirmando estereótipos racistas de superioridade branca.

  • Alternativa: pessoa de bom caráter, íntegra.

A coisa tá preta

  • Motivo: usado para descrever uma situação negativa, liga a cor negra a algo problemático ou ruim, desvalorizando a negritude.

  • Alternativa: a situação está complicada, situação difícil.

Para saber mais sobre esses termos e como substituí-los no dia a dia, procure as inúmeras iniciativas que propõem uma revisão de palavras racistas. Um bom exemplo é um trabalho da Universidade Federal de Santa Catarina que apresenta um glossário de termos racistas e suas substituições

Educação e consciência: mudar o vocabulário para combater o racismo

A luta contra o racismo linguístico exige uma mudança de comportamento que começa pela educação e conscientização. Ao entender o impacto histórico e social de termos racistas, podemos evitar a reprodução de preconceitos. 

No ambiente escolar, a inclusão de discussões sobre racismo e linguagem no currículo pode ajudar a criar uma geração mais consciente e preparada para combater preconceitos. É preciso que o tema seja tratado de forma séria e recorrente, incentivando os alunos a refletirem sobre o impacto das palavras e a adotarem um vocabulário mais inclusivo.

Empresas e instituições também têm um papel fundamental nesse processo. Promover treinamentos e palestras sobre diversidade e inclusão é uma forma eficaz de conscientizar os colaboradores sobre o uso de palavras ofensivas e incentivar a substituição de termos racistas por expressões neutras e respeitosas. 

A linguagem utilizada no ambiente corporativo reflete os valores da organização e, ao adotar uma postura consciente em relação ao vocabulário, as empresas contribuem para a criação de um ambiente mais igualitário e inclusivo.

Por fim, a substituição de palavras racistas por termos neutros é uma ação prática e necessária. Isso vai além da correção política: é uma forma de reconhecer o impacto da linguagem na manutenção do racismo e de se comprometer com a construção de uma sociedade mais justa. 

O papel de cada um no combate ao racismo

O combate ao racismo, especialmente o linguístico e o uso de palavras racistas, é uma responsabilidade de todos. A linguagem que usamos reflete os valores e as crenças que mantemos como sociedade, e palavras racistas perpetuam preconceitos históricos. Ao compreender o peso histórico e social dessas expressões, podemos começar a desconstruí-las e substituí-las por outras que promovam respeito e inclusão.

Cada pessoa tem um papel fundamental nessa transformação. Seja no ambiente escolar, familiar ou corporativo, a mudança no vocabulário e a conscientização sobre a importância de uma linguagem inclusiva são passos essenciais para a criação de uma sociedade menos desigual. 

O Dia Nacional da Consciência Negra nos lembra da necessidade de reflexão contínua e da luta diária contra todas as formas de racismo, inclusive as que estão enraizadas na nossa forma de falar, como as palavras racistas.

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